sábado, 23 de maio de 2015




Crianças e facas!

               
Lembram-se dos “falcões, os meninos do tráfico”? Pois é, eles se armaram de facas e desceram dos morros, e agora roubam e esfaqueiam pessoas aqui embaixo, porque lá em cima não tem mais vagas. É isto aí, não tem mais vaga para trabalhar com os traficantes.
                Minha “filosofia” superficial de escritório já me permite concluir algumas coisas: só existe o passado, o presente e o futuro não existem! Nosso país, nossas autoridades e nossos governantes, quase todos medíocres, precisam encontrar algum pingo de interesse e de sensibilidade, e precisam se indignar com a violação dos direitos de nossas crianças e adolescentes, alvos de leis avançadas, mas injustamente não aplicadas.
                Não estou defendendo adolescente infrator nenhum, muito pelo contrário. Tem que ser punido mesmo! Só estou dizendo que em nosso país só o passado existe, e ele está dentro de nós agora um pouco pior. O futuro nunca chega! Prometem, prometem, prometem, e nada acontece. Depois que passou o filme / documentário / realidade “falcões, meninos do tráfico”, em 2007 salvo engano, esperávamos que o mesmo daria ensejo a estudos sérios dos direitos humanos fundamentais, e à implementação de políticas e projetos sociais também sérios voltados para a proteção integral das crianças e dos adolescentes, como manda a Constituição Federal. Mas nada aconteceu!
                    E é justamente o que vai ocorrer agora: tudo o que vai restar, depois da passeata do domingo na Lagoa, será uma indignação momentânea e passageira que não vai tirar o sono de ninguém, muito menos vai preocupar a grande maioria. Mas, sabem qual é a grande ironia? Nós continuaremos sendo as vítimas dos futuros “Falcões”, agora armados de facas, como já somos há muito tempo. Seremos eu, o senhor leitor, nossos amigos, nossos filhos e nossos netos diante de crianças e facas.
                  O nosso Estado é um balão pronto para estourar, e nós precisamos descobrir com urgência o ponto exato que antecede a sua ruptura, porquanto não dá mais para suportar tanta miséria, tanta indiferença e tanta degradação. Obras “olímpicas” nós temos aos montes, mas educação, saúde e dignidade minguam em cada esquina. Não podemos mais suportar nosso sistema de saúde em frangalhos, nossa educação aviltada, e nossa esperança amputada: não há prótese para nada disto! A dignidade de todos os seres humanos, em nosso Estado, não passa de letra morta da Constituição Federal, e às vezes me parece que nossas autoridades estão esperando chegar até o limite em que podem ir, para só então partir em seus helicópteros. Será quando elas descobrirem, tarde demais, que deixaram tudo chegar longe demais! Nosso Estado, senhores, há muito tempo decidiu participar do banquete supremo da civilização: o da decadência.
                Educação senhores! É a palavra, é a solução. Educar as massas, levá-las para o território educacional, aquilo que Norberto Bobbio tão em apregoava, quando falava da promessa maior não cumprida pela democracia: a educação para a cidadania. Pela educação, dizia o filósofo, indivíduos passivos tornam-se cidadãos ativos, afastando o perigo de se transformarem em ovelhas dedicadas tão somente a pastar o capim, e não a reclamar quando o capim é escasso. Ou damos um jeito de colocar estas crianças e adolescentes nas escolas, ou vamos morrer cada vez mais nas mãos deles. Temos que ensinar a eles o que existe de melhor, antes que eles nos mostrem o que estão aprendendo de pior. Não acredito nas autoridades de meu Estado, mas a minha esperança tem que ser a última a morrer! Não quero um dia ser um a ficar diante de crianças e facas.

* Wanderley Rebello Filho é Conselheiro da OAB/RJ, Presidente das Comissões de Políticas sobre Drogas
da OAB/RJ  e da OAB/Barra da Tijuca.